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quinta-feira, 16 de dezembro de 2010

DANU DO NORTE E DO INVERNO


DANU, A GRANDE MÃE IRLANDESA


“No início havia o Vazio, a vastidão do Nada, a supremacia da criatividade não-diferenciada
Do vazio nasceu o Caos,
Da união entre o vazio e o caos originou-se Ana, a Grande Sonhadora, Criadora e Tecelã dos mundos, em cujo ventre fértil resplandeciam estrelas e planetas.
Da união entre Sonho e o nosso Sol foram criados a Mãe Terra, o
Pai Céu e o oceano, os ancestrais primevos.
Do encontro entre o céu e a Terra surgiram os Seres Brilhantes, os
Dakinis e os Dakas que trouxeram a luz ao mundo.
E do ventre de Ana, tocado pela luz das Plêiades, nasceram os Tuatha de
Danann, o povo da deusa Danu.”
Kathy Jones, “The Well of Ana”

Os primeiros relatos escritos sobre as lendas e as crenças dos povos celtas foram feitos pelos romanos, que invadiram a Grã Bretanha em 55 a.C. Na medida das suas conquistas, eles incorporavam ao seu próprio sistema religioso mitos e conceitos dos povos indígenas, registando-os, porém, de forma fragmentada e adaptada, em função da localização geográfica e da similitude entre uma divindade local e uma correspondente romana.

Estes registos referem-se aos antigos mitos irlandeses, galeses e escoceses, acrescentando, também, lendas das tribos celtas que tinham chegado posteriormente à Grã Bretanha (cerca de 500 a.C.), provavelmente vindas da França central. Ocultas nas histórias encontram-se reminiscências das tradições pré-celtas, dos povos neolíticos, construtores dos círculos de menires e das câmaras subterrâneas, encontradas em inúmeros lugares nas ilhas Britânicas e na Bretanha (região do Oeste da França).


Esta herança ancestral, preservada durante milénios pela tradição oral e pelas práticas religiosas pagãs, parcialmente registada por historiadores romanos, foi aproveitada, reinterpretada, deturpada e truncada nos relatos dos monges cristãos ao longo dos séculos. Mantendo somente o que convinha à moral e aos dogmas cristãos, os monges reduziram o vasto panteão e a rica simbologia celta a relatos épicos de guerras, invasões, intrigas, traições e atos imorais, perpetrados pelas várias raças e tribos, diferenciados apenas pela localização geográfica. Mesmo preservando resquícios das verdades originais, as histórias cristãs minimizaram ou ignoraram a beleza e a sabedoria do legado celta, reduzindo ou distorcendo o seu valor mítico e espiritual. Na visão patriarcal dos monges, as Deusas foram vistas como Rainhas e princesas, os deuses como Reis e Heróis e o significado transcendental foi diluído, modificado ou perdido.


No século XI foi publicado “O Livro das Invenções”, que descreve uma sucessão de 5 povos que teriam vivido na Irlanda antes da chegada dos celtas, os ancestrais dos habitantes atuais.
Nas lendas, estas raças diferentes são descritas duma forma ambígua, tendo tanto características divinas quanto humanas e sendo apresentadas como deusas, deuses, gigantes, devas e seres elementais (seres análogos aos de tantos outros mitos de várias culturas e países).


Sem precisar de entrar em detalhes da complexa nomenclatura e das vastas descrições das batalhas, o importante é saber que cada uma dessas raças foi vencida e seguida pela seguinte, alternando-se assim os seus mitos, as suas divindades e a sua organização social e religiosa.
A quarta raça - Tuatha de Danann ou povo da deusa Danu -, apareceu de forma misteriosa: não da terra, de uma direção definida, como outros invasores, mas do céu, simultaneamente das 4 direções. Aterraram no dia do Sabbat de Beltane e depois fundaram 4 cidades que se tornaram os centros espirituais da Irlanda.


Tanto a sua natureza, quanto a sua origem permanecem envoltas em mistério, mas sabe-se que os seus atributos eram de bondade e luz. Por terem vencido a “escura” e agressiva raça anterior, foram por isso chamados “ seres brilhantes”. Trouxeram ensinamentos e objetos de magia, arte, sabedoria e cura e deixaram como marcos os círculos de menires e os monumentos megalíticos. Após um longo e pacífico reinado, eles também foram vencidos pela última raça, os precursores dos celtas; depois da sua derrota retiraram-se para o interior das colinas sagradas, tornando-se o assim chamado “Povo das Fadas”. É importantíssimo ressaltar que apesar de se traduzir fairy por “fada”, este termo não descreve uma “diáfana figura feminina sobrevoando as flores”. O sentido arcaico de Fairy People refere-se a seres sobrenaturais, com aparência etérica, sim, mas pertencendo a ambos os sexos, jovens que gostavam de música, danças, cores, flores, e abominavam o ferro (comprovação da sua origem anterior à Idade do Ferro).

O maior legado dos Tuatha de Danann foi o culto da deusa Dana (também conhecida como Danu , Anu ou Ana), considerada a Deusa Mãe, progenitora das outras divindades. Representando a força ancestral da Terra, a fertilidade, a vida e a morte, Dana foi posteriormente considerada como a representação da tríplice manifestação divina, da qual sobreviveu até hoje somente o culto à Brighid, cristianizada e fervorosamente venerada como a milagreira Santa Brígida.


Apesar de o seu culto ter sido proibido pelo cristianismo e de o seu nome aos poucos ter sido esquecido, Danu está presente em toda a parte na Irlanda, seja nos verdes campos, no perfil arredondado das montanhas, no sussurro dos riachos. O Seu lugar sagrado no Condado de Kerry, chamado Paps of Anu, reproduz, na forma de duas colinas, os Seus fartos seios, cujos mamilos são formados por cairns, os antigos amontoados de pedras que foram formados pelas oferendas de pedras levadas pelos peregrinos ao longo dos tempos, em sinal de reverência e gratidão.


Atualmente, com o ressurgimento do Sagrado Feminino, Danu, assim como as Deusas de outras tradições, estão a ser lembradas e reverenciadas como Senhora da Terra, da Água, da Abundância, da plenitude da Natureza e da Soberania.

Mirella Faur
http://sitioremanso.multiply.com/journal/item/29

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